18 de junho de 2010

Um olhar furtivo

Levanta voo e balança-se instável de um lado para o outro. Depois cai suavemente sobre a relva verde e húmida. Ele, decidido, desenrola o fio e volta a levantar o pedaço de tecido alargado, com as cores da bandeira nacional, mas este continua sem se elevar mais de um metro no ar.

De repente o homem esconde-se por trás das árvores e desaparece do meu campo de visão. Acredito que continue a tentar içar o papagaio junto ao lago, mas não o vejo elevar-se e suponho infrutíferos os esforços do pobre guardador de patos.

Cansada de esperar desvio a minha atenção para o lago. A bandeira de Portugal, lustrosa, impõe-se altiva e balança ao sabor do vento no centro da rotunda. Os repuxos, torres de água poluída magicamente cristalina, estão mais baixos hoje para que não jorre água sobre os pára-brisas dos carros que passam. Os patos, na sua maioria, desapareceram do lago. Restam apenas dois pequenos animais que navegam majestosamente pela àgua. Os outros debicam plantas nas bordas dos passeios, alheios ao pouco carros que por ali passam num calmo domingo de início de Verão.

O homem aparece novamente, quando já não o espero. O papagaio eleva-se 3 metros no ar. Por segundos parece ter resultado, mas logo a seguir, e como se a terra o sugasse, entra em queda acentuada. Rodopiando velozmente, cai nos arbustos e enrola a cauda nos pequenos ramos. O homem, tenta mais duas vezes fazê-lo voar, mas o objecto recusa-se a levantar mais de um metro e tomba constantemente.

O homem volta a desaparecer por trás das árvores. Pergunto-me o que lá faz. Tentará arranjar o papagaio? Talvez se tenha quebrado ao cair nos arbustos em rodopios. Continuo à espera que ele volte ao meu campo de visão. Enquanto isso disperso o olhar na leve agitação citadina da manhã já avançada.

Da varanda do terceiro andar a vista é periférica. A esta altura é possível ver as andorinhas e as pombas voarem razantes à janela e desaparecerem para lá do telhado. Na janela do vizinho um gato pardo e robusto passeia-se no peitoril arriscando a morte, numa adrenalina literalmente animal, enquanto observa os pássaros voarem rente à sua cauda e descerem em voo picado para apanhar as migalhas que a mulher do segundo andar liberta ao sacudir a toalha do pequeno-almoço tardio.

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